Há dias, enquanto fazia a minha habitual ronda pelas redes sociais, algo que, confesso, tenho feito com moderação, por uma questão de sanidade mental, deparei-me com um anúncio curioso. Tratava-se da promoção de um debate entre apoiantes e críticos de Adalberto Costa Júnior, líder da UNITA.
Dias seguintes, a mesma página publicou um banner publicitário, onde promove outro debate, desta vez entre defensores e críticos do Executivo. Até aqui, tudo normal: o debate político é saudável e necessário numa democracia. O problema é como estamos a debater.
Nos últimos tempos, o debate público em Angola transformou-se num verdadeiro campo de batalha de egos e ressentimentos. “Fulanizou-se” o discurso. Deixámos de discutir ideias e passámos a discutir pessoas, quem grita mais alto, quem humilha melhor, quem colecciona mais “likes”.
Mas discutir política é muito mais do que trocar insultos em directo. Exige preparo, cultura geral e domínio dos temas, tanto para quem vai ao debate, como sobretudo para quem se propõe a moderá-lo. Infelizmente, não é o que temos assistido nos nossos debates políticos online.
Um exemplo recente ilustra bem o problema: Nice Zulo, um músico que ganhou notoriedade por declarações ofensivas, surge agora como “analista político”. Nada contra o seu direito de expressão; o problema é outro. Estamos a confundir o entretenimento com a reflexão política, e essa mistura tóxica empobrece o debate e banaliza o pensamento político.
As redes sociais tornaram-se uma arena onde todos são especialistas de ocasião. Cada um se sente autorizado a falar sobre qualquer tema, sem estudo, sem leitura e sem responsabilidade. O resultado é o que todos vemos: um discurso poluído, desumanizado e estéril.
Esta semana, uma notícia vinda da China chamou-me a atenção. O governo chinês aprovou uma regra curiosa: influenciadores digitais só poderão comentar assuntos “sérios”, como economia, medicina, política ou direito, se tiverem diploma comprovado nessas áreas.
Muitos, no Ocidente, viram nisso um acto de censura. Outros, uma medida de responsabilidade.
Mas há um ponto interessante: a China reconhece que opinar exige competência, e que falar para milhões de pessoas é um acto de poder, e, portanto, de responsabilidade.
Em Angola, ao contrário, parece que quanto menos se sabe, mais se fala. Aqui, a ignorância ganha seguidores, a gritaria rende visualizações e a desinformação vira entretenimento. Enquanto isso, a reflexão e o conhecimento perdem espaço para o espectáculo do improviso.
O país precisa reaprender a conversar. Precisamos voltar a discutir ideias, projectos e visões de futuro, e não pessoas.
Enquanto reduzirmos o debate público a ataques e provocações, continuaremos a afastar-nos da maturidade democrática de que tanto precisamos.
O verdadeiro desafio não é quem fala mais, mas quem pensa melhor. E pensar exige silêncio, leitura e respeito. Três coisas que o nosso “país digital” parece ter esquecido.
Talvez não precisemos de uma “lei chinesa” para obrigar os angolanos a estudar antes de opinar.
Mas precisamos, sim, de um mínimo de humildade intelectual.
Porque não é o diploma que faz o pensador, é a capacidade de reflectir com responsabilidade, e de saber que o país não avança com “likes”, mas com ideias bem pensadas e bem debatidas.
Fonte: Portal de Angola